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Arquivo Free Four – Pink Floyd: Roger Waters poderia ter acrescentado à obra “The Final Cut”, o subtítulo: ”o sono da razão produz monstros”, se Goya já não o tivesse feito

O pintor da corte espanhola, Francisco José de Goya Y Lucientes (1746-1828), era um homem realizado, até que uma doença – indiagnosticável à época, e sobre a qual hoje se tenta especular a partir dos sintomas – causou-lhe paralisia momentânea, cegueira parcial e surdez permanente.
O produto mais imediato dessa tragédia é a série de gravuras conhecida como Caprichos.

Nestas figuras percebe-se a obstinação de um iconoclasta em traduzir os mais variados costumes daquela sociedade num eterno ciclo de pulsões como avareza, charlatanismo e vaidade.

Roger Waters poderia ter acrescentado à obra “The Final Cut” (1983), o subtítulo: ”o sono da razão produz monstros”, se Goya já não o tivesse feito.

O tema, contudo, é basicamente o mesmo – apesar do par de séculos que as separam – e a forma (contundente) sobretudo, o que a afasta até mesmo da estética de “The Wall”.

Neste sentido, o crítico Stephen T. Erlewine assina um artigo para o site allmusic em que atesta não haver algo semelhante no repertório floydiano – ou outro trabalho sequer, de um artista do gênero – que se possa comparar a “The Final Cut“, prescrevendo-o exclusivamente aos ouvintes
dedicados.

Bom, eis aí outra experiência sem paralelo pra sua reflexão, meu bom Stephen: A Guerra (ao menos não se vê nenhum conscrito entre as legiões de ouvintes dedicados de “The Final Cut“)!

A guerra é o tópico principal, portanto. E suas consequências, principalmente.

Órfão de um combatente da Segunda Guerra, Waters explora o fenômeno obsessivamente desde os primórdios da banda.
Em uma de suas primeiras composições, Waters descreve a sina do cabo Clegg, que finalmente recebe da Rainha – em um devaneio – o devido reconhecimento pela perna extraviada no campo de batalha.

Na dura realidade, porém, um alquebrado e ainda mais amargo Goya retrataria na série Desastres da Guerra a sangrenta resistência à ocupação da Espanha pela França, Clegg encontraria sua medalha no zoológico, e a angelical Vera Lynn sre revelaria uma mentirosa sádica.
Dia desses um amigo postou um clipe de “The Final Cut” no Facebook e comentou que o álbum é subestimado.
Como o assunto Falklands/Malvinas voltou à baila às vésperas da apresentação de Waters no Brasil, resolvi engrossar o coro em defesa de TFC e acrescentar: Waters é um vocalista extremamente subestimado.

Um dos momentos de maior eletricidade em “The Wall” é a faixa “The Trial“, em que Waters sozinho acusa, depõe, julga, condena e clama – em vão – pelo perdão de seus pecados contra os irredutíveis membros de uma sociedade surrealista.

O próprio título alude ao clima teatral do álbum, sustentado do início ao fim pelo vocal inventivo de Waters – que às vezes se faz acompanhar de si mesmo, num estado de ânimo antagônico – costurado por imagens vividas (ecos tardios dos Desastres de Goya?).

Parte dessa resistência dos fãs se explica pelo fato de que, a julgar pela forma como comandava o Pink Floyd na época – o que resultou na cisão do grupo e posterior disputa judicial pela marca – o legado do próprio Waters não destoaria muito dos demais internos do The Fletcher Memorial Home (“para reis e tiranos incuráveis“).

Há uma versão remasterizada de TFC, lançada por ocasião de seu 21º aniversário (2004), com “When The Tigers Broke Free” – que originalmente é parte da trilha sonora de “The Wall” –  entre as faixas “One of The Few” e “The Hero´s Return“.

Obs.: o álbum é uma homenagem ao pai de Waters, Eric Fletcher Waters (daí o nome do asilo).

Arquivo Free Four - Pink Floyd: Roger Waters poderia ter acrescentado à obra "The Final Cut", o subtítulo: ”o sono da razão produz monstros", se Goya já não o tivesse feito

Pelo confrade Renato Azambuja.
Postado originalmente no finado blog Free Four, que dera origem à Confraria Floydstock.

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1 comentário em “Arquivo Free Four – Pink Floyd: Roger Waters poderia ter acrescentado à obra “The Final Cut”, o subtítulo: ”o sono da razão produz monstros”, se Goya já não o tivesse feito”

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