Embora se consagrado definitivamente na música ocidental já nos anos 60, não são poucos os que consideram os álbuns lançados por Dylan nos anos 70 superiores aos que editou na década anterior: mais maduro e ciente da sua importância, Dylan mostrava novas facetas ao público, como se vê neste “Desire“, que ora comentamos: um álbum incrível do começo ao fim.
Em “Hurricane” Dylan traz a vida de Rubin Carter – após este lhe mandar uma cópia de sua autobiografia que escrevera na prisão, “The Sixteenth Round“: “ao ler o livro de Rubin, percebi que éramos irmãos, espiritualmente falando. Ele é um homem brilhante e um dos mais honestos e profundos que conheci. É um cidadão perfeito e eu o amo como a um irmão. Não foi justo que aconteceu com ele e precisa ser solto.“
A causa de Carter havia gerado a The Hurricane Trust Found e Dylan, mesmo não sendo uma das celebridades que a ajudavam, deu muita credibilidade ao escrever a canção, além de fazer um concerto no Madison Square Garden, que tocou com várias presenças ilustres, sendo o legendário boxeador Muhammad Ali, uma delas. Em um dos momentos mais emocionantes, ligaram para a prisão onde Carter estava, que emocionado agradeceu o esforço. Os dois se encontraram pessoalmente no dia 5 de dezembro de 1975 na prisão Clinton State, onde fez um concerto, com Rubin subindo ao palco.
“Hurricane” é uma das canções mais longas já escritas por Dylan, uma história de quase seis páginas e teve que ser reescrita por pressão dos advogados da Columbia Records que temiam processos de Alfred Bello e Arthur Dexter Bradley, que eram acusados por Dylan de “sumirem com os corpos“, crime, do qual, não foram sequer julgados. Mas “Hurricane“, rendeu a ele um processo da ex-garçonete Patty Valentine, que não gostou nada de ver seu nome usado sem autorização.
Além de “Hurricane“, o disco trazia outros momentos inesquecíveis. “Isis” fala de uma jovem que casa antes mesmo de aprender os valores da lealdade. “Mozambique” nasceu de uma brincadeira entre Dylan e Levy que queriam ver quantas palavras com a terminação “ique” conheciam.
“One More Cup of Coffee” traz um dueto com a cantora country Emmylou Harris, que na mesma época cantou no Last Waltz (o show de despedida do The Band) a igualmente bela “Evangeline”. “Oh, Sister“, novamente cantada com Emmylou se tornou um dos momentos principais dos shows, em que fala da fragilidade do amor.
“Joey” rendeu outra polêmica, pois era uma homenagem ao gangster Joey Gallo, morto em 1972, aos 43 anos. Para Dylan, Gallo era um homem com princípios, que se recusava a matar inocentes, era amigo dos negros e um homem que protegeu seus familiares quando levaram tiros em um restaurante.
O disco fecha com uma balada dirigida à ex-esposa Shirley Marlin Noznisky, conhecida como Sara Dylan: “Sara“. Ela já havia sido tema de uma linda e pungente canção de amor em “Blonde on Blonde” (“Sad Eyed Lady of the Lowlands“). O divórcio fora retratado no primoroso disco “Blood on the Tracks“.
Ao ser lançado, “Desire” recebeu aprovação unânime da crítica e foi para o topo da parada norte-americana. Em 2003, o disco foi incluído na lista da revista Rolling Stone no nº 174 dos 500 Melhores Álbuns de Todos os Tempos.
Fonte: MOFO