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Humor: a jornada de um cinquentão no Lollapalooza Brasil

Leia abaixo o hilariante texto tirado do facebook do genial Mentor Neto sobre sua jornada pelos dois dias do Lollapalooza Brasil neste fim de semana último.

Juntamente com o show do Metallica e a detonada da apresentadora Titi Muller no DJ babaca, foi a melhor coisa que vi da edição tupiniquim do festival.

Diário do Lolla – Dia 1

O casal ao meu lado recém passou dos vinte anos.
Ele, um jovem saudável, com os cabelos bem à moda.
Batido com máquina 1 nos lados e lambido no topo e na franja.
Ela criada a leite de soja, seios fartos e petulantes.
Estão ansiosos para o início do show.
Nos primeiros acordes ele a ergue nos ombros.
Desde que a banda anunciou que viria, no ano passado, os dois esperam por esse exato momento.
Têm todas as letras engatilhadas na ponta da língua.
A câmera mostra a multidão em êxtase nos telões laterais.
O vocalista faz caras de Instagram.
O namorado não se importa em adquirir uma ou duas hérnias de disco, desde que aquele seja um momento inesquecível para ambos.
Então acontece.
A câmera fecha no casal, mas especificamente na moça que baila sobre os ombros do jovem.
Ela se vê no telão e não pensa duas vezes.
Para orgulho de seu pai, que assiste no Multishow, ela ergue a camiseta expondo os peitos em rede nacional.
São mais amplos do que pareciam quando cobertos.
Balançam independentes sob o sorriso desafiador da menina.
Agora ela parece um boneco de Olinda, girando no eixo do pé do namorado, que sorri orgulhoso como quem mostra um bilhete premiado.
A edição do Lolla desse ano teve muitos peitos.
Jovens adolescentes desfilaram com seus sutiãs desinibidamente.
Não sei porque me chamou a atenção isso.
Se estivessem de biquíni não seria mais ousado?
Vai ver é porque sutiã é para não ser visto em público.
Então estavam lá, centenas de amigas com seus sutiãs passeando pelo autódromo.
É a moda.
De moda, aliás, entendem os casais gays.
No Lolla os poucos casais de héteros são completamente desprovidos de charme.
Saiu de moda ser hetero. Usam roupas pouco inspiradas, caminham desanimados comendo batata no cone.
Os casais gays não.
Usam roupas bacanas, pulam, dançam, se entregam a bebidas coloridas.
Eu não sou gay nem tenho sutiã.
Estou deslocado.
Vejo um velho com uma camisa do Black Sabath.
Então me dou conta que ele deve ser uns dez anos mais novo que eu.
Sou o mais velho do autódromo.
Sou o único que viu José Carlos Pace correr nessa pista.
Então me dou conta de porque olham para mim.
Têm medo que eu possa ter um AVC.
Um desses jovens se aproxima de mim.
Temo que vá perguntar se preciso de ajuda:
– Você é…(hesita)…você?
– Eu sou eu – respondo delimitando meu corpo. – fora daqui já não sou mais eu. E aí dentro de você, é você.
– Não…digo…você é o Mentor Neto?
Fui reconhecido, para orgulho da Catu.
Gente muito gentil esses seguidores.
Encontrei oito!
Todos me trataram com enorme carinho.
Alguns até quiseram foto, para a surpresa de todos os outros que estavam em volta.
E eu nem precisei mostrar os peitos.
Agora já é noite.
Estou sentado na calçada, pregado.
Patricia e eu com dois copos de água tentando juntar forças para andar até onde estão as meninas.
Passa um sujeito de uns vinte e cinco anos.
Desde longe vinha olhando para mim.
Mais um seguidor, aviso a Patrícia.
Ele passa direto, mas deixa seu recado:
– Falaaaaaaaí Prof. Pasquale!
É a danada da maconha. Só pode ser.

Diário do Lolla – Dia 2

Acordo ao meio dia sem saber onde estou.
Não sinto minhas pernas do joelho para baixo.
Minhas batatas da perna se desligaram do organismo e imploram por uma gangrena.
Mas não posso atende-las.
Temos que partir para mais um dia no Lolla.
Penso em alugar uma cadeira de rodas.
Fast forward para o Festival.
Decidi que hoje não vou ao palco Ônix nem se os Stones me chamarem para uma canja.
Quando você entra no Lolla, o primeiro palco é o Axe, onde tocam os nomes menos importantes.
Depois vem o Perry, porque não conseguiram vender patrocínio.
Aí o Skoll, o principal.
Ali tocam as melhores bandas e é bom porque eles têm uma enfermaria perto caso eu precise de oxigênio.
Quando chego ali o meu relógio dispara de alegria. É meu recorde histórico de caminhada. O Steve Jobs aparece na telinha e me saúda pelo nome.
Aí vem o Ônix.
Logo depois de Araraquara.
Agora estou sentado numa colina de grama esperando o show do Two Door Cinema Club começar.
É muito inclinado o lugar.
Duas meninas se beijam de maneira efervescente a minha frente.
Não devem ter dezesseis anos, mas o beijo é uma rotisserie de variedades.
Acho lindo esse desprendimento e sou a favor de cada um cuidar da sua vida.
Mas fico olhando o espetáculo por mais tempo do que deveria.
Coisa de velho.
Sou acordado do meu transe pela banda que entra e começa a tocar.
Arrisco alguns pulinhos e pareço divertir um grupo de jovens atrás de mim:
– Isso aí, tio! Vamo pulá!
Fico sem graça e vou embora com a Patrícia.
No caminho para a tenda de alimentação dou mais alguns pulinhos, bem discretos.
Vejo um homem mais velho que eu.
– Ele parece um cearense – nota Patricia.
– Ele deve ter vindo de jangada – respondo.
O humor já acabou, como comprova o diálogo acima.
Estamos cansados.
Entro na fila para comer costelinhas de porco do chef Fogaça.
Um garoto fura a fila descaradamente.
Patricia perde a compostura e põe os moleques para correr.
A paciência também acabou.
Vou pedir um sanduíche de carne seca.
O garoto do caixa me reconhece:
– Rapaz! Minha avó é sua fã.
Avó.
Primeira atitude: rejuvenescer o público alvo.

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